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terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

Gigante esquecido: estádio de título brasileiro e segundo maior do interior de SP enfrenta o abandono

Estádio Teixeirão, em São José do Rio Preto, está abandonado (Foto: Arcílio Neto)
As pichações que estampam a fachada do Teixeirão são o cartão de visitas de um estádio castigado pelo tempo e abandono daqueles que deveriam ser os responsáveis pelos cuidados com um palco lendário que hoje vive apenas de passado.
As histórias vividas no estádio Benedito Teixeira, em São José do Rio Preto, nunca serão apagadas e sempre estarão vivas na memória de milhares de torcedores que viram a seleção brasileira, um título brasileiro do Santos, e os gigantes de São Paulo que fizeram do local sua segunda casa e, lá, disputaram clássicos marcantes.
E claro: o América-SP, que é o dono do estádio, mas, assim como o Teixeirão, está no fundo do poço e muito distante dos dias de glórias.
Além de tantas histórias, o estádio chama a atenção por sua imponência: com capacidade para cerca de 35 mil pessoas, é o segundo maior do interior do estado, ficando atrás apenas do Prudentão, em Presidente Prudente.
O ge foi ao Teixeirão e constatou o descuido com um patrimônio da cidade, do estado e do futebol brasileiro.
A decadência de um gigante
Logo no primeiro contato visual com o estádio, os sinais são chocantes. Além do festival de pichações, as paredes da fachada e de dentro estão descascando por completo.
Guardiãs do estádio, as pombas observam do alto os fios soltos e até ferros expostos em um perigo claro a quem está por perto.
Os corrimãos que foram planejados para levar aos camarotes estão completamente enferrujados, denunciando os anos de abandono.
Ao olhar para o gramado, é possível ver uma ruína em forma de trave. Um gol com traves desgastadas e enferrujadas é mais uma prova do efeito do tempo.
Os banheiros, por sua vez, estão em cenário caótico. Até a sala de troféus do América está com o vidro da janela quebrada.
O Teixeirão é vítima não só do abandono, como até de disputas judiciais. Desde 2015, por conta das dívidas do América, a Justiça determinou o leilão do estádio para amortizar as dívidas administrativas do clube proprietário.
Há nove anos, foi avaliado em R$ 35 milhões, com o lance inicial estipulado em R$ 21 milhões do terreno de 3 mil m². Porém, não houve interessados tanto em 2015, quanto em 2019 em uma terceira tentativa de leilão por determinação da Justiça do Trabalho.
O momento ruim do América reflete também na baixa ocupação do Teixeirão, que recebeu apenas 30% da sua capacidade total nos últimos 11 anos. Neste período, o Rubro disputou a quarta divisão do Campeonato Paulista em dez temporadas.
Desde 2014, o estádio recebeu 79 jogos, uma média de oito partidas por ano, ilustrando o calendário breve, que se tornou rotina para o América.
Em 2018, o ge esteve no Teixeirão e mostrou a sujeira nas arquibancadas e nos banheiros. Além das bilheterias, que chegaram até a virar "casa" para zelador. Na época, o chargista Clayton Esteves retratou o abandono do local (veja abaixo).
Teixeirão, um museu a céu aberto
O Teixeirão recém completou 28 anos de sua inauguração, que foi no dia 10 de fevereiro de 1996. O estádio foi entregue não acabado, pois ainda faltava a conclusão dos camarotes, que nunca ficaram prontos.
O palco histórico recebeu 47 jogos de Corinthians, Palmeiras, São Paulo e Santos. Logo em seu ano de inauguração, quase 40 mil pessoas presenciaram uma partida da seleção brasileira, que era a atual tetracampeã mundial.
Em um amistoso contra Gana, a Seleção treinada por Zagallo venceu por 8 a 2 com gols de Marques (2), Rivaldo, Luizão, Alexandre Lopes, Zé Maria, André Luiz e Sávio. A Amarelinha tinha ainda nomes como Dida, Aldair, Juninho Paulista, Amaral, Jamelli e Flávio Conceição.
O Teixeirão também testemunhou outro grande momento: o último título brasileiro do Santos, em 2004. Na 46ª rodada do Brasileirão, o Peixe conquistou a taça ao vencer o Vasco por 2 a 1, com gols de Ricardinho e Elano.
As ruínas do América
O América-SP tem até hoje o recorde de edições seguidas da elite do Campeonato Paulista. O Rubro foi figurinha carimbada edição após edição do Paulistão entre 1964 e 1997. Foram 44 participações na primeira divisão, sendo a última vez em 2007. A partir disso, a queda é vertiginosa: desde 2015 está na quarta divisão.
O abandono do Teixeirão aconteceu em consonância com a derrocada do América, após sucessivas más administrações. Considerado por muitos como o maior responsável por deixar o Rubro em frangalhos, Luiz Donizette Prieto, o Italiano, foi presidente do clube em quase todos os últimos momentos da década anterior.
Até a Justiça citou uma tentativa de Italiano de se "perpetuar no poder", quando afastou o dirigente da presidência por irregularidades no processo de eleição.
Atualmente, o América-SP tem uma dívida estimada de mais de R$ 30 milhões. Em dezembro de 2023, teve a Sociedade Anônima do Futebol (SAF) vendida por apenas R$ 1 milhão.
Após o afastamento de Italiano da presidência, em janeiro deste ano, a Justiça nomeou Samir Felício Barcha, sócio vitalício do América, para o cargo de administrador provisório do clube. Ele foi indicado para a função pelo autor da ação, Marcos Cezar Vilela.
O ge entrevistou o interventor que descreveu a situação de calamidade vivida pelo América-SP, em meio aos mais de 100 processos trabalhistas e as contas bloqueadas.
Eu como interventor estou de mãos amarradas, pois minha função é fazer as eleições e só. Eu não tenho um tostão em caixa e apenas um sócio pagante. O América não tem nada, suas contas bancárias, todas elas estão bloqueadas pela justiça trabalhista. Mais de 100 processos trabalhistas na justiça trabalhista e na civil.
– É realmente uma calamidade o que fizeram com o América campeão, com o América que enfrentava os grandes times de São Paulo, o América que teve o nome espalhado pelo Brasil e pelo mundo. Hoje o América vive de miséria. Até os jogos da A4 do Paulista, as taxas dos jogos e da Federação foram pagas por torcedores que fizeram vaquinha e arrumaram os honorários. Se não, o América já estaria eliminado por inadimplência das taxas – disse Samir.
O interventor do América-SP também lamentou o estado atual do Teixeirão, lembrou do passado glorioso e citou a falta de energia elétrica, os furtos e até a situação do gramado.
O estádio está precaríssimo. Quando você olha por dentro (vestiários, banheiros e toda estrutura interna), vai ver que está completamente abandonado. Dá até dó. Os sanitários das arquibancadas estão uma nojeira. Quando foi inaugurado, em 1996, o Teixeirão ainda estava incompleto, faltando os camarotes, terminar os sanitários e outras estruturas. Mesmo assim, foi considerado o sexto melhor do Brasil em beleza e qualidade.
Passado todo esse tempo, nada se fez. Hoje é um monumento ao descaso e um estádio que não tem energia elétrica e nem possibilidade de jogos noturnos. Toda fiação de rede, das torres, as caixas de energia, os disjuntores, barramentos de cobre foram roubados. Não tem mais nada. Dá uma revolta ver tudo aquilo como está. Esses administradores dos últimos anos nada fizeram. Não sei onde enfiaram tanto dinheiro que receberam dos campeonatos, das federações. Fisicamente no estádio não se aplicou nada. Só uma mãozinha de tinta por fora para dar aquela ilusão de estádio. O gramado se você andar por ele vai ver que é de tiririca. O sistema de irrigação, quando liga os bicos, há lugares de vazamento grandes de água. É uma coisa de louco. Os responsáveis, especialmente a diretoria que saiu, deveriam ser julgados por um tribunal – desabafou o interventor, Samir Felício Barcha.
Memórias distantes de um torcedor
A vida e a memória afetiva de Evandro Freire estão intimamente conectadas com o Teixeirão. A construção do estádio fez parte de um sonho do torcedor do América, desde as décadas de 70 e 80, quando o Rubro jogava no antigo Mário Alves Mendonça.
O engenheiro eletrotécnico que torce apenas para o Mecão se recorda da época pré-Teixeirão e do aperto que era assistir a um jogo no "Caldeirão do Diabo", acanhado estádio que abrigou as partidas do América até 1995.
– A gente olhava para o lado direito e via o Teixeirão ao fundo sendo construído. Ele foi o grande sonho do antigo presidente Benedito Teixeira, que é quem dá nome ao estádio. Todos falavam: 'merecemos assistir um jogo do América em um estádio à altura do clube'. Hoje muitos criticam o tamanho do Teixeirão e porque o time saiu do estádio antigo. Mas são pessoas que não viveram a década de 70 e 80, ao assistir jogos do América contra times grandes e até mesmo do interior.
Quando a campanha era boa, a lotação e o desconforto no Mário Alves Mendonça eram muito grandes. Pessoas voltaram para casa sem ingresso, sofriam para consumir água e sanduíche. Ninguém conseguia andar pelas arquibancadas. Quando o Teixeirão foi inaugurado, foi um sonho para nós. É uma das maiores obras do interior de SP, pela magnitude do estádio e do tamanho do clube que ele pertence – disse Evandro ao ge.
O Teixeirão foi inaugurado em 1996 para mudar a história do América, de São José do Rio Preto, do Brasil e, claro, do Evandro. O torcedor apaixonado se recorda de quando foi ao estádio com o pai na semana anterior à inauguração.
– As grandes memórias que temos estão ligadas aos jogos que o América venceu de maneira heroica, ou goleadas contra um time grande, ou a quebra de um tabu, a conquista de um título. Mas me vem à cabeça a semana anterior à inauguração do estádio, onde fomos eu e meu falecido pai, que era americano de coração. Foi ele que me ensinou a ser americano, e, assim como eu, só torcia pro América. Me lembro de irmos lá e ver a finalização das obras do Teixeirão, uma semana antes da estreia. Você vê o estádio todo pintado e saber que o América ia jogar naquele novo palco. Foi emocionante, não consigo traduzir isso em palavras – contou.
Em relação aos jogos marcantes, Evandro cita a vitória do América sobre o Corinthians, em 2004, além da final da Série A2 de 1999, quando o Mecão foi campeão sobre a Ponte Preta, e do 4 a 1 do Rubro sobre o Palmeiras, no Paulistão de 2005.
Há ainda o espaço no coração para os jogos da Copa São Paulo de Futebol Júnior de 2006, quando o América fez os primeiros jogos no Teixeirão na campanha que terminaria com o título inédito no Pacaembu.
A nostalgia com um passado vitorioso contrasta com o dissabor do fundo do poço que o América chegou há tempos. Evandro não ameniza as palavras para descrever esse momento.
– São tantos anos de desmando, ingerência, incapacidade de gestão, de completa ausência de amor pelo clube, que o atual estado do Teixeirão não gera mais surpresa a nenhum torcedor. Não só eu, vários outros torcedores se acostumaram com esse cenário. Infelizmente, vemos o nosso estádio, na condição de penúria, com banheiros sujos, cabines inacabadas, as cadeiras cativas faltando, o gramado em péssimo estado.
– Além da ausência do nome do grande idealizador da obra, o Benedito Teixeira, que foi tirado o nome dele da fachada do prédio. Tudo isso, com o passar dos anos, gerou um sentimento de resignação. Agora estamos vendo que pode ser dada a volta por cima com ações judiciais feitas por torcedores abnegados, que podem tirar do comando pessoas que não têm compromisso nenhum com o clube.
Nos anos áureos do Teixeirão, Evandro testemunhou partidas com até 35 mil pessoas. Agora, a realidade é de uma média de 200, 300 pessoas. O torcedor não tem dificuldade em explicar o motivo.
– Nos acostumamos a ver o Teixeirão vazio, porque futebol é feito de meritocracia. Um clube que ano após ano monta elencos ruins e a diretoria não demonstra nenhum comprometimento, obviamente tudo isso afasta a torcida. Houve um início de quebra de paradigma em 2023. O elenco foi muito guerreiro, passou de fases mais de uma vez, conseguiu deixar o América na quarta divisão e evitou o rebaixamento para a quinta divisão. Conforme o América passava de fase, a torcida comparecia mais e mais, inclusive com presença de crianças.
– Isso nos leva a acreditar de maneira que a torcida do América existe, ela só está hibernando. O América chamando a torcida de volta, com uma gestão transparente, competente, aberta à torcida, com o estádio recebendo bem o torcedor, a torcida vai voltar. Ela quer ver o América grande como os clubes que estão num patamar altíssimo hoje no interior de São Paulo – finalizou Evandro, torcedor fanático do América.
O próximo jogo no estádio Teixeirão é no dia 2 de março, quando o América-SP receberá o Vocem pela nona rodada da Série A4 do Campeonato Paulista. O Rubro ocupa a 11ª posição na tabela, com oito pontos conquistados em sete partidas.

Por Arcílio Neto 
ge São José do Rio Preto, SP

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